Lúcio: de Planaltina para o topo do mundo
Último pentacampeão jogando profissionalmente, Lúcio (também conhecido como Lucimar da Silva Ferreira) dá detalhes sobre sua carreira e fala sobre a sensação de ganhar uma copa do mundo e os desafios para se tornar jogador de futebol profissional.

JNB - Como você iniciou sua trajetória no futebol?
LÚCIO - Eu comecei em Planaltina. Comecei pelo amor ao futebol, amor à bola. Quando eu era moleque, não tinha a perspectiva de chegar onde Deus me colocou, na condição de ser um jogador de Seleção Brasileira, de ter ido jogar na Europa. Então essa paixão começou na rua mesmo, com meus irmãos e meus amigos. E isso foi evoluindo até alguns verem que eu tinha condição de ser um profissional. Fui me estruturando fisicamente e também acreditando que eu podia chegar bem mais longe. Me profissionalizei aos 16 anos no time de Planaltina.
Você contou com o apoio de quem durante essa trajetória?
Contei sempre com o apoio de Deus e da minha mãe. Foi ela quem me ajudou, me incentivou, comprou minha primeira chuteira e investiu onde poucas pessoas viam sucesso. O meu primeiro treinador também foi muito importante, o Zé Vasco. Ele foi a pessoa que realmente falou que eu tinha condição de ser jogador e me chamou para treinar com ele. Ele foi o cara que me colocou para cima.
Quando você considera ter sido a virada da sua carreira?
A virada da minha carreira foi no Internacional. Eu fui para lá como juniores ainda, com 19 anos, em 1997. Foi ali que eu comecei a acreditar mais ainda que eu me tornaria um jogador profissional de alto nível. Tive a certeza quando me chamaram para substituir um jogador do time titular que havia se machucado. Era uma partida em Belo Horizonte, contra o Cruzeiro.
Você em algum momento pensou em desistir da sua carreira de jogador?
Sim, por falta de incentivos aqui em Brasília. Eu sou filho de pais separados, então no começo, às vezes, eu tinha que abrir mão de jogar futebol para ajudar minha mãe a manter a casa. Tinha a necessidade de trabalhar e ajudar minha família, e nessa época eu pensei muito em parar de jogar.
Quando você começou a jogar futebol, já tinha a convicção de se profissionalizar?
Eu sempre tive o sonho, mas quando comecei era um sonho bem distante. Eu tinha consciência de que eram poucas as possibilidades de acontecer. Isso existiu sim. Minha família é de origem humilde. Somos três irmãos e sempre ralamos muito para conseguir ter uma boa condição de vida, para não deixar faltar nada em casa. Muitas vezes eu joguei com chuteira emprestada.
A minha primeira chuteira foi minha mãe que comprou, eu nunca esqueci. A gente não tinha condição de comprar, mas eu queria muito ter uma chuteira. Minha mãe então foi na loja e deu um cheque pré-datado como pagamento, e nós não tínhamos um centavo na conta.
Mas ela foi na fé de que a gente ia trabalhar para pagar a chuteira, e nós conseguimos. Nesse momento eu me dediquei mais ainda, assumi a reponsabilidade, buscando não decepcionar minha família que acreditou muito em mim.
Copa de 2002, foi um dos principais momentos da sua carreira?
Sim. Minha primeira convocação para a Seleção Brasileira foi no ano 2000, e já em 2002 fui campeão do mundo. Foi um período muito curto, com uma pressão muito grande, mas graças a Deus eu consegui dar esse salto na minha carreira, ficando marcado na minha vida.
Em 2006, apesar das críticas à atuação da Seleção no Mundial, você foi um dos poucos jogadores que foram elogiados, mesmo com a derrota. A que você atribui esse carinho do torcedor?
No futebol, umas das grandes virtudes que eu sempre acreditei foi a disciplina. A disciplina é algo fundamental. Então eu não podia me apoiar no título de 2002 para jogar a Copa daquele ano de qualquer jeito. Disciplina, trabalho e seriedade, sempre levei isso comigo. E dia após dia, temos que estar sempre nos atualizando e buscando novos horizontes. Estar na Copa do Mundo é uma pressão muito grande, pois você está ali representando o seu país, a sua família, então a seriedade se soma ao desejo de vencer.
Você é o último pentacampeão na ativa. A que se deve o fato de você estar jogando aos 40 anos com o mesmo vigor profissional de sempre?
Primeiramente, eu devo a Deus, pois ele que me protege dentro e fora de campo. Eu nunca tive nenhuma lesão grave na carreira que complicasse a minha atuação ou que interferisse no meu desempenho. O que me fez continuar jogando até hoje foi o amor pelo que eu faço. Através do futebol, eu consegui formar minha família, ajudar meus pais, meus irmãos, conquistar o respeito do mundo. Eu tenho orgulho de falar para o meu filho que eu ajudei a colocar uma estrela na camisa do Brasil. Isso tudo me dá inspiração pra continuar jogando com amor ao que faço.
Você tem a pretensão de um dia ser tornar técnico de algum time?
Eu tenho vontade de aprender. Eu não quero tomar decisões precipitadas. Por isso, eu quero antes estudar e aprender um pouco mais esse outro lado. Ser jogador é uma coisa, já treinador é algo completamente diferente.
Qual sua opinião sobre a equipe que irá disputar a Copa da Rússia?
É uma Seleção muito estruturada. O Tite entrou e conseguiu mudar o ambiente, mudar o clima da Seleção. Os jogadores são muito bons, e eu tive a oportunidade de jogar com alguns deles. Por isso, acredito que o Brasil tem muita chance de voltar campeão. Um grupo muito forte, focado e unido. O extracampo da qualidade fortalece o elenco, que nenhuma Seleção desse Mundial tem igual.
Que seleções você acredita que podem dar trabalho para o Brasil?
A Alemanha é uma Seleção muito forte, eles são muito disciplinados. Eles não vão entrar no Mundial somente pensando no mérito da vitória na Copa do Brasil. Eles são muito ambiciosos e focados. A França também vem forte, e acredito que os belgas também podem vir a ser uma surpresa, pois têm bons jogadores. E tem a Argentina, que apesar de não estar bem, pode crescer muito durante competição.